Autenticar cidadãos, definir modelos de negócio na partilha de dados, garantir privacidade, contratar profissionais de TI, foram algumas das dificuldades, reconhecidas em conferência da EY Portugal.

Carlos Lobo (EY), Marco Espinheira (Cascais), Gil Nadais (Águeda) e Paulo Fernandes (Fundão)
Garantir a privacidade e “ciber-liberdade” dos munícipes é um dos maiores desafios da gestão autárquica em contexto de transformação digital, considerou Marco Espinheira, em conferência organizada pela EY Portugal. O “director do futuro” na Câmara de Cascais defendeu que essa função terá de ser do Estado porque os cidadãos não se vão importar com o problema.
O desafio tende a ser ainda mais melindroso tendo em conta o que confirmou: “com os dados recolhidos conseguimos saber muita coisa, desde a hora a que chegam a casa e se têm filhos, por exemplo”. Mas ao mesmo tempo, a participação dos cidadãos com a partilha dos seus dados é vista como fundamental, por Espinheira.
A Câmara Municipal de Cascais implantou uma plataforma de autenticação que o responsável considerou como um “game changer”. Um elemento de mudança radical de abordagem, baseada na identificação do cidadão online: uma plataforma que providencia uma identidade ao munícipe e o autentica também perante os fornecedores externos de serviços.
Servirá para suportar a oferta de “mobilidade como serviço” do concelho, ao acolher o processo de pagamento e receitas do mesmo. “Só assim conseguimos sentar à mesma mesa a Uber e os taxistas” explicou. Um dos principais desafios de Lisboa também está ligado à administração de dados.
O vice-presidente da Câmara Municipal, Duarte Cordeiro vincou a urgência de haver um modelo de negócio para a partilha de elementos de informação com parceiros, no âmbito das iniciativas de dados abertos. A fórmula não “é clara” e é necessário acelerar a definição de um “modelo de partilha de valor” capaz de proteger o interesse público na exploração dos dados, referiu.
Paulo Fernandes (Fundão) considerou importante haver “uma segunda vaga de abertura de centros de competências mais focados na transferência de tecnologia”.
Envolve gerir o valor das redes pertencentes à câmara, como as de iluminação e de semáforos, interessantes pela sua capilaridade. Com a consolidação da implementação do centro de operações integrado, Duarte Cordeiro, considera importante incorporar nele mais informação útil e para isso é necessário investir em infra-estrutura (como por exemplo na instalação de sensores).
Depois de considerar que as empresas de software não respondem à necessidades das autarquias, o presidente da Câmara Municipal de Águeda enfatizou o valor das redes de iluminação e o desafio que é optimizar o seu aproveitamento.
O poder local português estará a “perder o comboio” nesse tema, mas é possível “colocar inteligência suportada pela rede, disponibilizar serviços e e fazer controlo de tráfego com câmaras”, exemplificou. Contudo “estamos apenas a substituir ponto de luz por pontos de luz”, criticou.
Tanto este autarca, como Paulo Fernandes, presidente da Câmara do Fundão, vincaram a importância de suportar a “tutoria” ou ensino à distância. Nadais considerou mesmo que será uma forma de mudar a atitude das pessoas para o uso de serviços digitais, através do sistema de ensino.
“Mas interessa também manter as competências de atendimento [na administração local]”, avisou.
Paulo Fernandes considerou ainda que um dos maiores desafios do poder local será conseguir “democratizar a inovação”. Nesse contexto, o autarca da cidade onde a Altran tem uma unidade de desenvolvimento de software, defende a necessidade de “ter uma segunda vaga de centros de competências mais focados na transferência de tecnologia”.
Além disso, a comunicação dos serviços existentes ao cidadão parece ser um problema transversal. Tal como a garantir a interoperacionalidade dos sistemas internos da câmara e com o exterior.
Outro dos problemas, assinalado por Paulo Fernandes, é a capacidade de avaliação dos impactos das iniciativas. O autarca não fica satisfeito com “índices de satisfação” gerais.
Parcerias são formas de resolver contratação
Face à importância das competências dos recurso humanos, mas também aos salários dos programadores praticados Marco Espinheira (Cascais) considerou importante definir novos modelos de contratação. O responsável já se deparou com profissionais a pedirem entre 2500 e 3500 euros mensais. No seu entender estabelecer parcerias como aquela que Cascais mantém com a Citypoint é uma solução.
A startup surgiu num concurso promovido pelo município com uma aplicação móvel de gamificação, sobre o qual foi desenvolvido um programa de fidelização. Nele os cidadãos utilizadores vão ganhando pontos com as suas boas práticas em benefício do concelho e dos quais podem usufruir nos serviços de outros parceiros.
A plataforma pode ser precursora de iniciativas ainda mais “interessantes”: a cobrança de taxas de lixo e estacionamento diferenciadas para os munícipes de acordo com vários critérios. Quem trabalha dentro do concelho poderá ter tarifas mais baixas para arrumar o carro, exemplificou.
Contudo Gil Nadais defendeu a necessidade de haver maior flexibilidade para o que denominou “modelos colaborativos” visando a “redução” de custos. Na perspectiva de Paulo Fernandes os municípios têm de avançar para implantação de serviços à escala das Comunidades Intermunicipais. E com espírito de maior “coesão” defendeu.