Nem tudo o que está na “Deep Web” é ilegal

Apenas 4% da Internet é conhecida pela gestão de topo das empresas. O resto está na “Deep” ou “Dark Web”. É preciso cuidado, mas nem tudo é mau abaixo da linha de água, dizem os especialistas.

A Internet é como um icebergue. Uma ínfima parte é visível. A maior parte do volume está escondida. De facto, apenas 4% da Internet é conhecida pela gestão de topo das empresas, diz Luc Billot, arquitecto de sistemas técnicos de cibersegurança, que fez a analogia com um icebergue.

Na Internet apenas uma pequena percentagem dos dados estão acima da linha de água, e uma parte na camada submersa no topo. Tudo o resto é inacessível à maioria das pessoas.

Luc Billot falava durante uma conferência promovida pela Associação para a Promoção e Desenvolvimento da Sociedade da Informação (APDSI) intitulada “Um mergulho no escuro da Deep e Dark Web”.

“O que está abaixo da linha de água não é necessariamente mau”. Nem tudo é pirataria ou actividades ilegais. Os oradores assinalara que “[a Deep Web] se pode usar em países onde há censura e para monitorizar a utilização da cloud, por exemplo”.

É também na “Deep Web” que se podem encontrar artigos de maior qualidade sobre determinadas matérias, como é o caso do repositório Hidden Wiki ou o projecto The Onion Router (TOR), um software livre e de código aberto que proporciona o anonimato na navegação, recorrendo a várias camadas de cifra.

De qualquer modo, alerta para os cuidados que se devem ter quando se passa para o lado mais obscuro da Web. “Quando se entra deve-se tomar medidas de segurança. Por exemplo, “ter dois computadores, para que só um navegue nas águas profundas da Internet, e ter protecção avançada contra malware”, Luc Billot, citando recomendações da Cisco, aconselha ainda os hackers do bem, a avisar a polícia antes de entrar na deepweb “para ver o que lá está”, não se dê o caso de serem confundidos com outro tipo de hackers.

A regulação deve ser o caminho a seguir, sendo [de lamentar] a ausência “dos políticos nestes debates da deep dark web”, Henrique Domingos (Fundação para a Ciência e Tecnologia)

A “Deep Dark Web” é o termo criado por Michael K. Bergman, CEO e co-fundador da Structured Dynamics, para se referir aos conteúdos que não podem ser indexados pelos motores de busca e, por isso, não estão disponíveis directamente para quem navega na Internet, explica a APDSI, que reuniu especialistas num evento em que foram reveladas algumas valências do TOR – The Onion Router

A regulamentação da Deep Web foi o tema abordado por Henrique Domingos, da Fundação para a Ciência e Tecnologia. Só desse modo “nos podemos proteger melhor”. O professor considera que o bloqueio da Internet tem implicações grandes e graves ao nível da economia, pelo que a regulação deve ser o caminho a seguir, lamentando no entanto, a ausência “dos políticos nestes debates da DeepDark Web”. Sendo um mercado que precisa de ser regulamentado, deveria estar na agenda da política, frisou.

“A realidade digital mimica a realidade física. Raptar pessoas, roubar ou assassinar não é um problema digital”. Pedro Adão (IST)

Ainda sobre o Tor, Carlos Nunes, da Unidade Nacional de Combate ao Cibercrime e à Criminalidade Tecnológica da Polícia Judiciária, explicou que o recurso ao Tor “não é um problema em si”, podendo ser, no entanto, “as consequências que lhe estão agregadas”. Apesar de se ter de ter em conta que a navegação no Tor pode implicar enfrentar “preconceitos” relacionados com “um modo de funcionar que permite a recolha de benefícios sem se identificar quem deles beneficia, por outro”, também é aí que é possível alojar sites e sistemas informáticos e levar a liberdade de expressão onde não existe.

O investigador alerta, no entanto, para a importância de “viver com consciência de que existe escuridão”. Pedro Adão, professor no Instituto Superior Técnico, frisou que a Deep Web não necessariamente ilegal e que no Tor em particular não existe apenas trafulhice. “A realidade digital mimetiza a realidade física”, salientou: “Raptar pessoas, roubar ou assassinar não é um problema digital”, conclui.

96% da Internet é “Deep” ou “Dark”

Luc Billot, arquitecto de sistemas técnicos de ciber-segurança.

A web é composta por várias camadas de navegação, explicou Luc Billot, arquitecto de sistemas técnicos de ciber-segurança, na conferência sobre Deep e Dark Web promovida este mês pela APDSI. Fazendo uma analogia com um icebergue, a parte visível corresponde à Web pública, à qual acedemos diariamente, são os 4% visíveis do icebergue. Cerca de oito mil milhões de páginas que o Google consegue indexar.

Abaixo da linha de água estão os remanescentes 96% do universo digital. Na Deep Web, protegidos por palavras-chave.

A camada superior da parte submersa ainda não é propriamente perigosa, embora possa registar-se alguma actividade menos clara. A maioria dos utilizadores poderá estar a usá-la, ainda que não se aperceba, assinala Luc Billot, referindo-se por exemplo a redes P2P, redes de distribuição de conteúdos, bases de dados SQL, newsgroups, entre outros.

Indo mais fundo, chega-se a uma zona em que, mais uma vez decorrem actividades honestas circulam, mas que é também povoada de dados por vezes criminosos, como conteúdos adultos ou o streaming de filmes. Continuando a mergulhar, chega-se a zonas extremamente difíceis de alcançar para o utilizador comum, mas que é “a zona mais segura da Internet, do ponto de vista dos piratas” (éticos ou não). É aqui que estão os sites de grupos fechados e que utilizam proxy, locais como o Tor ou alguma outra ferramenta que lhes permita acesso. Será aqui que se poderão encontrar mais conteúdo adulto, depoimentos de hackers, manuais de suicídio ou documentos de organizações mafiosas.

Existem finalmente níveis “hipotéticos” submersos a um nível demasiado profundo, onde se encontram as teorias da conspiração, podendo inclusivamente estar defendidos por “uma espécie de firewall que impede os utilizadores de ir mais fundo. Poderá haver inclusivamente programas controlados por inteligência artificial a correr computação quântica, explicou Luc Billot.




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