“Não podemos aceitar robôs incapazes de se explicarem”

Mas será cada vez mais normal que os robôs nos possam pedir ajuda, num estado de “autonomia simbiótica”, proposta pela investigadora portuguesa Manuela Veloso.

Paulo Carvalho (CML Lisboa), António Pires (IBM), Patrícia Arriaga (ISCTE), Estela Bicho (U.Minho) Luís Almeida (U.Porto), Manuela Veloso (Carnegie Mellon) e Tiago Ribeiro (INESC)

Portugal está bem cotado à escala mundial, e considerando as características do país, quanto à investigação sobre robótica, considerou Carlos Cardeira, presidente da Sociedade Portuguesa de Robótica, na abertura de uma conferência da APDSI sobre os desafios na concepção e adopção de robôs.

Na adopção da robótica a indústria fabril também está a adaptar-se, segundo o responsável, que referiu o sector do calçado, assim o da pedra e a Portucel, como exemplos. À escala mundial um dos maiores desafios no desenvolvimento tecnológico da área é conseguir fazer com que os robots dêem explicações, de forma natural e interactiva, sobre a sua actividade.

É o que “tira o sono” a Manuela Veloso, ironizou a investigadora portuguesa, no seu entusiasmo pela investigação em inteligência artificial. A líder do departamento dedicado a essa área na Universidade Carnegie Mellon é peremptória: “não podemos criar e aceitar robôs incapazes de se explicarem”.

A sua equipa de investigação já conseguiu desenvolver robots com autonomia e inteligência artificial suficiente para receber visitantes e conduzi-los ao seu escritório. Beneficiam de uma série tecnologias e algoritmos de localização, além de sensores de profundidade para perceberem onde estão e circularem pelo departamento.

Mas ainda não sabem explicar por onde andaram, apesar de serem melhores do que os seres humanos a determinarem com rigor matemático a sua localização. “São necessários talvez mais dez anos de investigação”, prevê a investigadora.

Poderá ser necessário criar um sistema de suporte, “como por exemplo um centro de contacto para ajudar” robôs a resolverem problemas e a contornarem obstáculos, diz Manuela Veloso (Carnegie Mellon)

As explicações não são universais e o seu grau de detalhe tem de variar. Os robôs precisam de aprender a enquadrar as questões dos seres humanos num “espaço de verbalização” segundo proposto por um aluno de Veloso, organizado em torno de três eixos: especificidade, localização e abstracção.

Não obstante, podem tornar-se mais depressa em importantes agentes de recolha automática de dados, lembrou Veloso, recomendando robôs semelhantes à capital do país, no âmbito do projecto Lisboa Robotics. Quando o director da Câmara Municipal de Lisboa, Paulo Carvalho resumia uma apresentação do projecto, a investigadora deixou escapar uma reacção facial de surpresa pela iniciativa.

Os referidos robots, os Cobots, já percorreram mais de 1300 quilómetros desde Novembro de 2014 e são capazes de ir buscar objectos, a pedido, e usar o elevador. Não têm braços para abrir a porta ou conseguir que alguém coloque os objectos a transportar no seu cesto, mas recorrem à interacção com os humanos para resolver esses problemas.

Quando ninguém ajuda ou sentem-se bloqueados, mandam pedidos de auxílio por email a Manuela Veloso, ou outros assistentes.

Esta preparação constitui uma evidência que tende a um estado de relação dos robôs com os humanos: aquilo a que Manuela Veloso chama autonomia simbiótica. No mundo real, os “robôs não vão saber tudo, é preciso que avisem e peçam ajuda”. E isso é perfeitamente aceitável.

A interacção vai criar confiança entre seres humanos e robôs num cenário em que trabalham em conjunto. Será necessário, no entanto, criar um sistema de suporte, “como por exemplo um centro de contacto para ajudar” as máquinas a resolverem problemas e a contornarem obstáculos.

Ou enviar-lhes ajuda presencial. Porque o objectivo mais sofisticado é que circulem mesmo mediante um mapa de planeamento: os CoRobots são capazes de “assimilar” mapas disponibilizados em PDF para poderem orientar-se.

Mas algumas limitações ou formas de funcionar que os impede de ir contra obstáculos, servirão para os manipular. Colocando artificialmente obstáculos no seu caminho será possível mandá-los por escadas abaixo, por exemplo.

Estela Bicho investigadora da Universidade do Minho envolvida numa projecto de implantação de porta paletes robotizados na Bosch Portugal, confirmou com a importância da ideia de se prever ajuda para os robôs. O plano na empresa prevê o funcionamento das máquinas em autonomia e integração com os sistemas de logística.

Contudo para “haver coordenação é necessário que o robôs conheçam a estrutura da tarefa”. Subsistem problemas e a investigadora considera que os trabalhadores poderão ser os tutores das portas-paletes, capazes de ajudar nas melhorias necessárias.

Manuela Veloso considerou que uma das maiores diferenças da actual vaga, em torno da inteligência artificial e a robótica, é a quantidade de dados já disponível. A grande preocupação das sociedades, na sua opinião, deveria ser entender como usá-los da forma mais benéfica para o ser humano, em vez de se apoquentar tanto com potenciais perdas de empregos.

A investigadora considera que o ser humano não será capaz de extrair os benefícios possíveis, sem a inteligência artificial. Sem este conjunto de tecnologia uma grande quantidade de dados será desperdiçada. Além disso outra área que merece mais atenção é o da interacção entre seres humanos e máquinas de inteligência artificial, sublinhou.

A propósito da perda de postos de trabalho João Sequeira, do Instituto Superior Técnico, considerou  que haverá sobretudo transferência de trabalhadores para outros cargos.

“Acontecem coisas muito estranhas na interacção entre pessoas e ser humanos”

Colocando alguma incerteza sobre a interacção entre seres humanos e robôs, o investigador afirma que podem acontecer situações “muito estranhas inesperadas e de uma riqueza fantástica”. Mas tornam mais difícil construir robôs inteligentes.
A psicóloga Patrícia Arriaga, do ISCTE, acrescentou não haver respostas sobre a melhor forma de interagir com um robot, que possam ser extraídas de estudos do relacionamento entre indivíduos. Mas ainda detalhou que em experiências mais específicas, as pessoas mais competitivas gostaram de lidar com robôs com actuação também mais competitivas.

Coloca-se a hipótese de as máquinas serem personalizadas e preparadas para as necessidades das pessoas. E neste cenário, surgem também factores de aparência a influenciar as preferências.

Nota-se que as pessoas estranham o bizarro, confirma. Em paralelo, esperam que os robôs sejam úteis sem substituir trabalhadores.

João Sequeira ainda referiu outra dificuldade no enquadramento dos robôs na estrutura actual de TIC: a maioria das tecnologias foi desenvolvida para as pessoas e não para máquinas usarem, como é o caso da Internet. “Quando elas falham é mais grave para os robôs que ficam sem saber como reagir e a tecnologia deixa muito a desejar”, explica.

Luís Almeida, professor na Universidade do Porto, sublinhou no entanto, o contributo da inteligência artificial para ajudar nos processos de decisão. Mas além disso, acredita que a área abra grande potencial de “utilização e com certo grau de improviso”.




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