A incorporação de nativos digitais nos corpos de gestão mais ligados às plataformas digitais do Estado faz antever conflitos.

António Gameiro Marques (Ministério da Defesa), gestor da Critical Software, Carlos Gonçalves(eSPap), Augusto Fragoso (Anacom), Francisco Barbeira (BPI)
O tema da renovação de competências e quadros gestores na Administração Pública (AP) provocou uma divergência de opiniões no debate, promovido na quarta-feira pela eSPap, sobre o valor das TIC no sector público. Em resposta a uma questão vinda da audiência, o CIO da Anacom, Augusto Fragoso, concordou com um refrescamento, sobretudo nas competências de gestão.
O mesmo defendeu até o afastamento de gestores públicos, pouco interessados em actualizarem os seus conhecimentos. Mas, mais importante, chegou a sugerir a incorporação de nativos digitais nas equipas de administração das organizações, como forma de renovar as perspectivas sobre a acção da AP.
Esta “deve criar condições para que novas competências venham” para as equipas de gestão das suas organizações. Antes, noutra intervenção, questionou se o Estado estaria disposto a pagar o suficiente para ter os recursos humanos necessários à sua modernização.
Talvez mal interpretado, recebeu uma reacção discordante por parte do Carlos Gonçalves, vogal do Conselho Directivo da eSPap, particularmente quanto ao afastamento de recursos humanos menos jovens. O secretário-geral adjunto do ministério da Defesa, António Gameiro Marques, deu suporte à posição do vogal da eSPap.
“A sociedade é demasiado complexa para se olhar para ela de forma tão linear”, declarou, lembrando a necessidade de se ter em conta várias perspectivas. Descartou a hipótese mais arrojada de Fragoso, mas voltou à linha de pensamento que defendera anteriormente na sua apresentação.
Assim, afirmou ser preferível “perguntar aos mais novos” qual a sua perspectiva sobre os problemas, visando depois incorporar a informação no processo de decisão. A proposta vai no sentido de “perguntar para envolver” as pessoas e entidades no processo de modernização.
Uma das ideias-chave das suas propostas liga-se precisamente à necessidade de fomentar a cooperação entre os recursos humanos e entidades da AP. A discordância surgida no debate revelou talvez um dos factores mais importante para a falta de cooperação notada por Gameiro Marques.
Este reconheceu na sua apresentação que, por exemplo, a arquitectura da AP é inspirada em “paradigmas anacrónicos” para “desafios diferentes”, sendo pouco flexível para corresponder à mudança. Um pouco como explicou Augusto Fragoso, quando vincou a necessidade de haver novas capacidades de gestão para lidar com os novos desafios.
Este responsável louvou o espírito de entrega à causa pública de muitos funcionários públicos (“heróis”, como lhes chamou), mas vincou o problema de contratar as pessoas necessárias para um processo completo de modernização:
‒ envolvendo um governo de TIC com a visibilidade global sobre uma arquitectura de carácter empresarial, com estratégias claras (que não existem) e neutralizando a dispersão de competências;
‒ implantando processos cíclicos de inovação e gestão de ideias;
‒ gerindo compras eficazes, em termos de custos e benefícios, com orçamentos cada vez mais curtos.
O desafio da contratação é, segundo Augusto Fragoso, semelhante ao das empresas, mas na AP as dificuldades são mais agudas. Por não haver um “arquitecto” ou pela dispersão de competências, por exemplo.
A AP “não está a conseguir congregar o conhecimento existente [na sua organização] em modelos transversais de modo a criar processos de inovação e de simplificação”, resumiu. E uma das suas dúvidas é se o Estado conseguirá convencer a trabalhar consigo, e pagar devidamente, os profissionais necessários para mudar isso.