MES em Portugal

Antecipando a realização da primeira conferência sobre MES em Portugal, Francisco Almada-Lobo, CEO da Critical Manufacturing, analisa a situação nacional destes Sistemas de Gestão de Produção.

Francisco Almada-Lobo - Critical ManufacturingA implantação dos sistemas de MES em Portugal está muito longe da dos países mais industrializados.

Segundo a caracterização efectuada para a CIP – Confederação Empresarial de Portugal – em “Indústria Portuguesa: Situação Actual e Evolução Recente”, a indústria transformadora nacional apresenta na última década um aumento do valor de volume de negócios global, fruto essencialmente do aumento da orientação exportadora. No entanto, outros indicadores de desempenho, como a produtividade, não evidenciam melhorias estruturais assinaláveis.

Um dos fatores poderá estar relacionado com a muito baixa implantação de sistemas de informação especializados na gestão de operações fabris, os chamados sistemas de MES.

De facto, segundo os últimos dados disponíveis da Manufacturing Enterprise Solutions Association (MESA International), mais de 40% das empresas industriais dos países mais avançados utilizam sistemas de MES, contra um valor estimado de menos de 5% no tecido industrial português.

O que é o MES?
MES é o acrónimo de Manufacturing Execution System, traduzido habitualmente para português como Sistemas de Gestão de Produção. Embora o termo tenha sido introduzido no léxico dos sistemas de informação apenas em 1990, as principais funções deste tipo de software eram já utilizadas há mais de 20 anos nas indústrias aeroespacial, automóvel, de semicondutores, farmacêutica e petroquímica, tendo posteriormente alastrado aos restantes sectores industriais.

O MES é um sistema de informação que permite a gestão de todo o ambiente de produção, fazendo a interface entre os sistemas corporativos transversais (ERP – Enterprise Resource Planning) e a automação fabril. Mas mais do que uma camada de interface, é um sistema que tem como principais objectivos o controlo e a melhoria dos processos de produção e de qualidade, incluindo gestão de materiais, produtos, equipamentos, fluxos de produção, operações de fabrico, receitas, aquisição de dados, etc.

A sua implementação tem inúmeras vantagens, que se dividem essencialmente em três grandes grupos:
– Aumento de produtividade – aumento da cadência de produção e redução de custos de produção – maior rendimento, menor manutenção e redução de custos laborais.

– Maior flexibilidade – mais rápida reacção às variações e contingências de mercado e mais rápida introdução de novos produtos.

– Maior qualidade – monitorização e controlo de processos de fabrico, gestão de excepções e cumprimento de normas.

Porque é que estes sistemas estão tão pouco disseminados na indústria portuguesa?
São várias as razões que contribuem para esta baixa implantação.

Em primeiro lugar, recorrendo às conclusões do estudo da CIP, a reestruturação industrial dos últimos anos não se traduziu no reforço efectivo da especialização sectorial. De facto, pelo contrário, assistiu-se a uma maior dispersão, que não favorece estratégias comuns, economias de escala ou acções de benchmarking e aprendizagem entre empresas, fazendo com que estas actuem de forma isolada e muitas vezes alheias às melhores práticas das suas congéneres estrangeiras, que incluem, entre outros factores, a utilização cada vez maior de sistemas de MES.

Em segundo lugar, e ainda a partir das conclusões do estudo referido, não se verifica uma tendência robusta de reestruturação no sentido de um maior peso dos sectores intensivos em tecnologia ou I&D e de uma maior utilização de recursos humanos com níveis mais elevados de qualificação. Ora, ainda que os sistemas de MES apresentem retornos de investimento elevados independentemente dos sectores industriais, são praticamente indispensáveis nos sectores de maior pendor tecnológico.

Em terceiro lugar, e de certa forma ligado ao ponto anterior, está o nível de apetência tecnológica dos decisores, em especial no que diz respeito aos sistemas de informação. Sendo o software um activo intangível, mesmo quando apresenta níveis estimados de retorno, através de aumentos de produtividade ou qualidade, proporcionalmente superiores aos dos investimentos mais tangíveis, são frequentemente preteridos face a estes últimos.

Em quarto lugar, a maior parte dos investimentos em sistemas de informação ao longo dos últimos anos foram efectuados na área de sistemas corporativos (ERP). Estes investimentos não estão, em muitos casos, ainda totalmente amortizados e acarretaram muitas vezes um esforço, tempo e investimento bastante superiores aos inicialmente estimados. Esta situação faz naturalmente aumentar o nível de relutância das empresas à possibilidade de novos investimentos em sistemas de informação.

Por último, há um factor que é simultaneamente causa e consequência desta baixa implantação de sistemas na indústria portuguesa, e que é a quase total ausência de fornecedores de soluções de MES portugueses ou integradores de sistemas especializados de MES em Portugal, situação que só muito recentemente se começou a inverter.

Como é que a indústria tem tentado ultrapassar as dificuldades da ausência de MES?
Uma parte muito significativa da indústria portuguesa simplesmente não tira partido de todo o potencial que tem. No entanto, revestem-se de particular importância alguns aspectos relacionados com a forma como algumas empresas procuraram ultrapassar os problemas que os sistemas de MES vêm resolver, mas sem estes últimos, através de uma de duas formas:

– recurso aos sistemas ERP – embora pareça natural a sua extensão aos processos industriais, estes são criados para gerir os processos transversais das empresas, revelando-se menos adaptados e com uma cobertura insuficiente dos processos industriais de chão de fábrica, que acarretam um nível de especialização muito superior ao dos processos corporativos. Sistemas de ERP e MES são efectivamente complementares, mas não se substituem e lidam com necessidades diferentes ao nível de flexibilidade de processos, de requisitos de tempo-real, de volume e nível de detalhe de dados ou de capacidade de integração com os níveis de automação.

– recurso ao desenvolvimento de aplicações específicas – esta opção tem normalmente pouco sucesso. Por um lado porque são muitas as características específicas deste tipo de software que não são normalmente do conhecimento geral e que origina enormes atrasos de desenvolvimento e desadequação das soluções. Por outro, há a natural tendência da construção da solução para os casos de uso específicos conhecidos – ora mesmo que estes sejam correctamente identificados e avaliados, não vão naturalmente manter-se estáticos no tempo. Novos produtos, novos tipos de equipamento, novos processos de fabrico ou processos logísticos, novos requisitos de automação, novas normas ou regras que é necessário cumprir, tornam estes sistemas obsoletos em relativamente pouco tempo.

Estas opções, que podem parecer à partida as mais económicas, traduzem-se invariavelmente em opções muito mais caras, originando enormes esforços para as manter e fazer evoluir de acordo com as necessidades de negócio, originando a prazo projectos de migração para soluções de MES, nessa altura com graus de complexidade, criticidade e investimento ainda mais elevados.

Conclusões
Com a necessidade, cada vez mais óbvia, de operação num ambiente global, a envolvente para a indústria portuguesa caracteriza-se pela necessidade de ciclos de vida de produto cada vez mais curtos, normas e regulamentos cada vez mais exigentes e uma pressão de preços esmagadora.

Para fazer face a estes desafios, a indústria portuguesa, terá necessariamente que actuar de forma integrada ao nível de processos de negócio e de produção, ao nível de organização e controlo, ao nível de qualificações dos seus recursos humanos e ao nível dos sistemas de informação. Só a actuação simultânea e integrada a estes níveis permitirá operar com sucesso nos mercados internacionais.

Os sistemas de MES têm contribuído para que as empresas industriais oriundas dos países mais avançados potenciem a sua capacidade instalada e aumentem a sua competitividade. Portugal terá necessariamente que adoptar o mesmo tipo de soluções para realizar o máximo potencial das suas unidades fabris.

A primeira conferência exclusivamente dedicada a sistemas de MES em Portugal decorrerá no próximo dia 26 de Março no Parque Tecnológico da Maia. Com um conjunto abrangente de oradores, este evento procurará permitir discutir e dar resposta aos principais desafios da implantação de sistemas de MES em Portugal.




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