O director-geral da Micro Focus, Pedro Soldado, quer aproveitar a dimensão alcançada na fusão com a Attachmate para melhorar nos serviços. A operação conjunta arranca a 1 de Maio.
As sinergias tecnológicas da fusão entre a Micro Focus e Attachmate são várias, mas o director-geral da organização para Portugal e Espanha quer aproveitá-la também de outra forma: beneficiar da dimensão alcançada, em recursos humanos, para melhorar o suporte ao cliente.
A fusão está em curso mas a operação conjunta só arranca a 1 de Maio, depois de fechado o ano fiscal das duas organizações. A empresa pretende manter o seu escritório em Portugal
CW ‒ Quanto tempo deverá demorar a Micro Focus a entrar num funcionamento normal ou em “velocidade de cruzeiro”, depois da fusão?
Pedro Soldado ‒ A fusão está a ser trabalhada há dois anos. As empresas estudaram-na bem e nenhuma tinha necessidade financeira de vender activos. O ano fiscal da Attachmate acaba a 31 de Março e o da Micro Focus termina a 30 de Abril. A 1 de Maio devemos começar a trabalhar como uma só empresa.
CW ‒ Onde ficará a sede da nova organização, já que a Attachmate tem sede em Houston (EUA) e a Micro Focus em Londres?
PS ‒ Em Londres e o CEO será Kevin Loosemore. Até àquela data, temos instruções para desenvolver o negócio separadamente, embora já haja equipas a funcionarem conjuntamente, nos recursos humanos e em aspectos técnicos.
CW ‒ E o que que falta fazer?
PS ‒ Em algumas situações, há duplicidade de escritórios. Como é o caso em Portugal, o objectivo será funcionar num só escritório. Parece trivial mas dá trabalho.
CW ‒ Que sinergias previstas serão mais importantes no mercado português?
PS ‒ As mesmas que à escala global. A Micro Focus desenvolve a sua actividade na área do Cobol e da qualidade de software da modernização de aplicações. Excepto na área de emulação de terminais, a fusão complementa-nos.
A Attachmate tem soluções de segurança, Linux, open source, gestão de identidades e virtualização. Os clientes pediam-nos para recomendar tecnologia de segurança, sistema operativo e isso ganhamos com as linhas de NetIQ e Suse [da Attachmate]. Agora podemos dar mais linhas de oportunidade de negócio aos parceiros.
CW ‒ Mas quais serão as áreas mais enriquecidas pelas sinergias?
PS ‒ Na modernização de aplicações…
CW – Para ambientes de cloud computing?
PS ‒ Por exemplo. Antes desta fusão, éramos capazes de movê-las para qualquer ambiente. Mas eram ambientes que não “pertenciam” à Micro Focus – Azure, Google, AWS. Esse compromisso mantém-se, vamos suportar tudo o que há no mercado ou se quiser.
Agora, se não houver preferência, temos uma oferta conjunta como o Suse Linux. Queremos ter uma oferta de pacotes com soluções de extremo a extremo. Não só a aplicação modernizada, para colocar na infra-estrutura que o cliente quiser, mas também podemos oferecer o sistema operativo, a modernização, a segurança, a gestão de identidades, com monitorização.
CW ‒ E que outras sinergias?
PS ‒ Há muitas. A força de vendas da Attachmate poderá ajudar a Micro Focus a desenvolver o seu negócio nos EUA. E a Micro Focus ajudará o negócio da Attachmate a firmar-se na Europa.
CW ‒ A fusão muda a estratégia para Portugal de alguma forma?
PS ‒ Para a operação em Portugal, liderada por João Rato, tal como para o resto, não se divulgou a estrutura definitiva. E nem se vai revelar até 30 de Abril. Há um grupo de trabalho a definir isso. O escritório em Portugal deverá manter-se e as linhas de negócio também.
CW ‒ A abordagem ao mercado vai manter-se?
PS ‒ É bastante parecida. Temos boa presença de há muito anos. Interessa-nos o “cross seling” mas também queremos melhorar o “customer care”: chegar aos nossos clientes e dar-lhes melhor suporte. Deverá haver uma diferença relacionada com a maior dimensão que atingimos, e que em Portugal poderá ser mais importante. Vai haver talvez um número de clientes seleccionados, aos quais queremos dar um melhor serviço, com o aumento de recursos que vamos ter.
CW ‒ Qual será a estratégia da empresa para parceiros integradores? Que percentagem de negócios da Micro Focus passa por esse canal?
PS ‒ Há duas linhas de volume de negócios: licenças e suporte, e serviços. Na parte de licenças e suporte de toda a área de Cobol, modernização e enterprise, é 80% directo.
No negócio de Borland e qualidade de software, é 80% indirecto. A parte de serviços é quase toda dos integradores. As ferramentas só por si não têm muito valor, na qualidade de software, gestão de ciclo de vida das aplicações, gestão de testes, de requisitos, configuração e mudanças.
É necessário integrá-las num processo. E disso, 80% é também de integradores e parceiros. As empresas grandes querem comprar-nos as licenças. Como os projectos de modernização são muitas vezes de outsourcing, contrata-se sempre um integrador para os serviços.
CW ‒ E a fusão vai manter isso assim?
PS ‒ Mantém mas separa por linhas de negócio. Há linhas de negócio directas, como as da Attachmate, e outras que vão incorporar muitos serviços, como a parte de Suse. Neste caso, os contratos são formados directamente com esta operação, mas envolvem sempre um integrador que participa com serviços.
Somos uma empresa de software e não de serviços. Temos um número de pessoas especializadas, mas é para dar suporte a parceiros ou em situações específicas.
CW ‒ Como fica segmentada a vossa actividade e volume de negócios por linhas de negócio?
PS ‒ A parte de Cobol mantém-se como uma linha, mas há zonas de sinergias. A parte de modernização e “enterprise” é outra linha. A Atachmate é outra, juntamente com a das tecnologias Rumba e Novell. A que mais pesa em venda de licenças ‒ 30% ‒ é o Cobol e a modernização está a crescer 200%, mesmo com o Cobol a ter incremento de 3%.
CW ‒ E que factores estão a impulsionar o crescimento do Suse?
PS ‒ O mercado continua a exigir redução de custos e há certos sistemas operativos relacionados com Linux e open source que têm maior procura. É uma operação suportada por um modelo distinto da empresa e será totalmente independente. Todas as linhas terão um presidente mas esta será ainda mais autónoma, com negócio baseado na subscrição e na cobrança do serviço de integração e manutenção.
CW ‒ Mas porque precisa de ter maior independência?
PS ‒ Queremos que a tecnologia de qualquer linha seja passível de integração universal. Não queremos sugerir que desejamos levar os clientes para o Suse. E, além disso, a linha tem um modelo diferente, com questões de parceiros e serviços específicos.
CW ‒ Falta comprar alguma empresa para a Micro Focus ter a oferta pretendida?
PS ‒ Oficialmente, dizem-nos que o trabalho nos próximos dois a três anos é de integração. Temos feito muitas aquisições e teremos muito trabalho.
CW ‒ Como deverá evoluir a relação com a Microsoft em Portugal?
PS ‒ É e será um dos parceiros preferidos. As primeiras versões das nossas soluções de “enterprise” são testadas com tecnologias Microsoft. Não esperamos mudanças.
CW ‒ Quando surge um projecto novo, o que propõem primeiro?
PS ‒ Há sempre tecnologia já instalada e o cliente quer é normalizar a plataforma tecnológica. Não vai mudar de tecnologia por um fabricante, quer tudo alinhado. Mas se o cliente tiver tudo em Linux, propomos Suse. Se já tem Windows, alinhamos com esse ambiente.
CW ‒ O que é melhor para o vosso negócio: cloud pública, privada ou híbrida?
PS ‒ Para nós é igual.
CW ‒ Mas a mudança para cloud pública não envolve mais trabalho de modernização de aplicações?
PS ‒ Se o cliente quer apenas reduzir custos e lidar com picos de processamento, a cloud pública é melhor. Mas se quer reduzir custos, ter melhor segurança, poderá conformar-se com uma virtualização mais profunda das suas infra-estruturas, sem falar em cloud privada.
Para nós, a pública favorece-nos porque confirma que podem ter as aplicações a um custo mais baixo. Mas o nosso cliente tradicional fica com a cloud privada e prefere ir passo a passo, mesmo quando garantimos o suporte total ao processo de migração. É que esta envolve aplicações centrais do negócio, às vezes com 30 anos, e mete-lhes respeito passar tudo directamente para a cloud.
CW ‒ Quais são os sectores mais importantes para a Micro Focus em Portugal? Há particularidades?
PS ‒ São os mesmos sectores, talvez com mais enfoque. O sector financeiro é o mais importante e tem muito mais peso em Portugal, face ao das telecomunicações, do que noutros países. Há também o sector público, mas está mais centrado nas aplicações, desenvolvidas sobre o núcleo da nossa tecnologia.
CW ‒ E tencionam desenvolver algum enfoque específico no sector público?
PS ‒ Sim, esperamos maior investimento em toda a península.
CW – O tema da automatização dos processos de gestão de infra-estrutura é particularmente importante em Portugal, porque muitas empresas ainda não a garantiram. Quais são os desafios neste campo para as empresas portuguesas?
PS ‒ É um processo que envolve muito trabalho, mas não será mais difícil para as empresas portuguesas. Sei que as tecnologias NetIQ poderão ajudar.
Estrutura da facturação da Micro Focus depois da fusão (Portugal)
Com a fusão, a Micro Focus passa a ter uma facturação próxima dos 1,4 mil milhões de dólares. Terá perto de 4.500 empregados e uma presença em mais de 30 países, com 5.000 parceiros e 20 mil clientes.
O seu volume de negócios (não revelado) deverá distribuir-se da seguinte forma, segundo Pedro Soldado:
‒ Cobol e “enterprise” (modernização de aplicações): 30%;
‒ Suse Linux: 25%;
‒ Attachmate, Rumba e Novel: 15%;
‒ NetIQ: 15%;
‒ Borland: 10%.