Tempo livre para inovar é uma boa ideia ou um desperdício de talento técnico?

Líderes de TI que reservam tempo para a criatividade da equipa dizem ter trabalhadores mais felizes, clientes mais satisfeitos e, às vezes, até mesmo aumento de receitas.

Se já usou um Post-it ou envia mensagens de uma conta do Gmail, tem beneficiado de programas de inovação corporativa que dão aos empregados tempo para serem criativos – e, às vezes, inventarem produtos populares.

O Google é bem conhecido na comunidade da tecnologia pelo “tempo de 20%”, que dá aos funcionários um dia por semana para que se dediquem às suas paixões, mas não é a primeira empresa a fazer isso. Durante décadas, a 3M alocou 15% do tempo dos seus funcionários à inovação, o que levou à criação do agora omnipresente Post-it, entre outros produtos.

Dan Pink, autor do best-seller “Drive: The Surprising Truth About What Motivates Us“, diz que números concretos sobre os programas de inovação das empresas são difíceis de encontrar, mas o interesse pela prática está em ascensão. “Eu sei que cada vez mais organizações estão a olhar para as empresas que estão a fazer isso, e que essa prática se está a tornar mais popular”.

Porquê? Porque de outra forma, a inovação não acontece. “O CEO pode dizer que inovar é uma das prioridades”, diz Doug Williams, analista da Forrester Research, “mas há sempre algo acontecendo no curto prazo que empurra a inovação para o longo prazo”.

Quando a inovação é adiada por muito tempo, as empresas ficam enfraquecidas – basta lembrar os casos do reverso da sorte da RIM ou a difamação da Microsoft nos mídia pela sua percebida incapacidade de inovar. “Os programas de inovação removem as restrições que acompanham o trabalho tradicional e oferecem um espaço seguro para o fracasso”, diz Pink. “Isso permite que as pessoas tentem arriscar mais”.

Prós e contras dos tempos de folga
Algumas vezes conhecidos como “tempo off para inovação” (ou ITO, na sigla em inglês), os programas de criatividade visam debelar a estagnação em múltiplas frentes. Dão aos funcionários a liberdade para explorar e a capacidade de serem criativos, o que pode melhorar o moral e aumentar o desempenho. O resultado final pode ser um produto ou recurso que aumente a produtividade, a receita das empresas, ou ambos.

Eles representam também uma nova forma de ajudar para reter os empregados no mercado de trabalho competitivo de hoje. As velhas técnicas motivacionais têm o seu curso.

“É energizante para os funcionários fazer uma pausa no seu dia a dia e pensar criativamente sobre a resolução de outros problemas ou o uso diferenciado de uma tecnologia”, diz Williams. “Os funcionários reconhecem este tempo como algo valioso”.

Infelizmente, para alguns gestores é difícil deixar os funcionários trabalharem meio-dia de uma semana sem esperar resultados concretos. Para os funcionários, pode ser difícil mudar o foco e pegar em algo amorfo, quando no mundo real existem prazos. Mas para aqueles que embarcam em tais programas, o potencial de resultados positivos vale o esforço da adaptação à nova rotina.

Qual é a frequência ideal?
Um dos maiores factores para determinar o sucesso de um programa de inovação é a sua frequência. Entre aqueles que já adoptam um programa assim há pouca consistência. Eles variam de alguns dias por ano a um dia trimestral ou algum tempo em cada semana.

Uma coisa parece clara: enquanto os “20% de tempo livre” da Google se tornou uma palavra de ordem, para outras empresas pode ser um padrão que são incapazes de oferecer. “Algumas empresas simplesmente não podem dar-se ao luxo de permitir que os empregados tirem 20% da sua semana para trabalhar dessa forma”, diz Williams, lembrando que para algumas empresas, 10% – essencialmente, uma tarde por semana num dia das 9h às 17h – é mais razoável. Alguns fazem ainda menos.

Robin Beck, vice-presidente de sistemas de informação e computação na Universidade da Pensilvânia, promove um dia por ano para que os funcionários se dediquem a melhorar processos de TI, à sua escolha.

“Queremos promover a inovação e criatividade, mas quase sempre a realidade do dia a dia da TI impede isso”, explica Beck. A obrigatoriedade de tempo na agenda corporativa impede tornar a inovação uma prioridade, diz. O que ele faz é dar a oportunidade aos funcionários de cozinharem ideias que estão suspensas.

O “dia de exploração” começa com uma wiki na qual os funcionários de TI partilham as ideias com o propósito de atrair colaboradores. Equipas e indivíduos trabalham no seu projecto em um dos dois dias (a fim de proporcionar flexibilidade), e no no terceiro dia, apelidado de “Day Out”, apresentam os avanços que tiveram.

A participação não é obrigatória, mas a maioria dos 300 funcionários de Beck participou no ano passado, e as discussões já deram frutos. Uma equipa abordou o problema em curso de acesso dos dispositivos pessoais dos estudantes à rede “wireless” da universidade. Desenvolveu um novo processo, mais simplificado que economizou tempo tanto para os alunos como para os funcionários de TI.

A Atlassian, empresa de software de colaboração, suporta dois diferentes programas de inovação – o programa de  “20% de tempo livre” começou em 2006 e o outro, que ocorre trimestralmente ao longo de 24 horas, chamado Shipit, começou em 2007.

O Shipit começa às 16h de uma quinta-feira e vai até às 16h do dia seguinte. “A ideia é dar aos empregados a oportunidade de se dedicar a algo que ele gostaria de resolver”, diz o presidente da empresa, Jay Simons, acrescentando que os funcionários podem trabalhar sozinhos ou em equipas, geralmente não superior a cinco membros.

O projecto pode ser um protótipo de um novo recurso, ou uma correção para um produto existente, mas o que quer que seja, tem que ser capaz de ser concluído em 24 horas. Um requisito fundamental: os resultados do trabalho Shipit devem ser apresentados aos colegas de trabalho durante uma demonstração de cinco minutos.

Apenas cerca de um terço da empresa, ou 170 funcionários – a maioria engenheiros – participa do programa 20%, porque é difícil dedicar um dia por semana a alguma coisa, diz Simons.

Os dois programas existem lado a lado, diz, porque servem propósitos diferentes. O programa Shipit tem sido a fonte de “centenas de pequenas melhorias nos processos de negócios”, enquanto o programa 20% tem tido menos resultados em volume, mas maior impacto.

Como se mede esse grande impacto? Um deles evoluiu para uma ferramenta de manipulação open source baseada em JavaScript. E um engenheiro de garantia de qualidade – não um programador de software – decidiu construir um sistema “tracking” de bugs de uso interno para a empresa, que acompanha projectos de desenvolvimento de software. O protótipo foi desenvolvido através do programa 20%. O resultado foi tão impressionante que a Atlassian transformou-o em produto, o Bonfire, em Julho de 2011. Qual o valor da receita total na última contagem? Um milhão de dólares, e o engenheiro é agora o gestor de produto.

Mas nem todas as inovações se pagam ou são concebidas para isso.

São necessários parâmetros
Permitir algo tão vago como tempo para inovar pode ser uma maldição para algumas organizações de TI, ou para os seus gestores. “A inovação e a criatividade são partes importantes do que qualquer organização de TI faz todos os dias”, diz Beck Penn.

Dan Pink vai mais longe: “uma razão para que o desenvolvimento de software e TI funcione bem em programas de inovação é que as tarefas que saem delas pode ser bastante discretas. Há sempre coisas que podem ser melhoradas em produtos de software e componentes que você. pode consertar facilmente. O software é modular, e um monte de codificação presta-se ao trabalho, individual ou em equipa de duas ou três pessoas. Não é como construir um carro, onde se precisa de quantidades enormes de espaço físico ou de equipamentos”.

Mas os programas de ITO necessitam de orientações, Algumas empresas dispõem de ferramentas de comunicação interna, como o Yammer, onde os funcionários podem postar ideias e formar equipas. Chamarthi e a sua equipa reúnem-se semanalmente para rever as ideias. Se o lado do negócio gosta o suficiente para o financir, tem que diminuir a prioridade num outro projecto. A mensagem subjacente para a equipa de TI: projectos 20% têm que ter algum valor comercial.

Na Atlassian, os funcionários têm que obter o patrocínio de três outros engenheiros e, em seguida, apresentar a proposta a um dos fundadores, para aprovação.

Uma vez que os parâmetros são definidos, os CIOs aconselham paciência quando se trata de implementar tais programas.

Têm que se definir as expectativas partindo do princípio de que esta é uma experiência, e pode mudar ao longo do caminho. Também tem que se ter flexibilidade. Muitas vezes, os líderes de tecnologia querem construir uma solução perfeita desde o primeiro dia, mas os resultados de programas como estes não têm que ser perfeito.

Por fim, adverte Beck, se a inovação e a criatividade não são parte da cultura existente, não se mudará isso num dia. “Tem que acontecer numa base consistente. Seja paciente. Você está a plantar sementes que  podem levar algum tempo a germinar”.

Como iniciar um programa de tempo livre para inovação?
Se está a pensar em começar um  programa de tempo livre para inovação no seu departamento, eis alguns conselhos de gestores de TI que já os fizeram:

1 – Decida qual a percentagem de tempo que o programa irá cobrir – 20%, 10% ou menos. Não há regras rígidas e rápidas, e você tem que equilibrar a produtividade dos funcionários com a ideia de libertar a inovação.

2 – Crie formas de gestão de qualquer programa que vá consumir meio-dia, um dia, uma semana ou mais, mantendo sempre parte da equipa focada no “trabalho” do dia a dia.

3 – Encoraje a participação voluntária. Nem todos no departamento de TI possam querer participar.

4 – Amplie a participação para além de programadores, envolvendo todo o pessoal de TI e, nalguns casos, pessoas das áreas de negócio.

5 – Aplique um pouco de estrutura e marcos para garantir que os projectos não persistam sem resultados.

6 – Pense em como vai apoiar a colaboração, quer através de técnicas digitais – como wikis para discussões assíncronas – ou técnicas físicas, tais como salas de conferências onde as equipas possam trabalhar.

7 – Certifique-se de acompanhar as ideias – mesmo as descartadas, já que alguém pode querer resolvê-las mais tarde.

8 – Considere configurar um sistema de recompensas. É verdade que já está a pagar a pessoas para trabalharem, mas quando um dos resultados da inovação gerar ganhos enormes, pode querer pensar em bonificações.

9 – Faça a gestão das suas próprias expectativas e as da gestão sénior. Apoio à inovação pode não apresentar resultados imediatos, e você deve sentir-se livre para ajustar o programa com base no “feedback” dos participantes.
(Howard Baldwin/Computerworld/IDG Now!)




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