Até o presidente da Assoft, Luís Sousa, admitiu a possibilidade de, nalgumas circunstâncias, se poder eliminar a figura do intermediário nas cadeias de valor, durante uma sessão da XX Semana Informática do IST.
A ideia não é nova e consolida-se cada vez que o papel da Internet como plataforma de distribuição é realçado: os intermediários podem constituir peças prescindíveis na cadeia de valor de vários sectores, como o da música. Ou do software.
Em debate sobre a partilha de ficheiros e pirataria na XX Semana Informática (SINFO) promovida pelo Instituto Superior Técnico, o presidente da Assoft, Luís Sousa, explicou como era possível disponibilizar software, directamente ao consumidor, em open source. Como membro do painel, o presidente da Ansol, Rui Seabra, aproveitou logo para salientar como o sector do software provou ser possível eliminar do processo o intermediário.
Corrigindo com outra ideia as declarações anteriores, Luís Sousa procurou salientar que no caso do software considera “haver necessidade” de distribuidores porque “acrescentam valor à cadeia” de distribuição. Mas admitiu que em alguns casos a figura de intermediário já não faz sentido.
O fundador do Partido Pirata sueco, Rick Falkvinge, mostrou a sua concordância com várias ideias, mas com ironia frisou que elas levavam-no a outras conclusões. “Não percebo porque tem de haver distribuidores ou intermediários, e se não tiverem um papel vão mesmo desaparecer, a menos que haja legislação a protegê-los – mas nesse caso haverá uma distorção”, ressalvou.
Em sentido contrário ao que defende a Assoft, o político não admite a necessidade de se controlar a forma como o software é usado, incluindo como é partilhado: porque isso será uma interferência nos direitos de propriedade, transferidos no acto da compra para o cliente.
Assim, o mercado fica distorcido, do seu ponto de vista. “Gostava de ver a cadeia de valor desenvencilhar-se livremente”, sugeriu Falkvinge.
Luís Sousa também acredita que o mercado deve decidir qual é a melhor solução. Contudo, para este responsável, nem sempre ele evolui de forma satisfatória.
“Se um autor de software não quer ser copiado, deverá ter essa possibilidade. Mas o mercado que decida. Deve haver legislação suficiente para isso”, defendeu.
Segundo salientou o presidente da associação portuguesa, esta admite a partilha de conteúdos e de software dentro dos limites da lei. Mas ele não concorda com o carregamento de software para um plataforma para ser descarregado, gratuitamente (se o autor do mesmo não autorizar).
Foco deve estar no carregamento
Para Nuno Cardoso, coordenador do Movimento Partido Pirata Português, o descarregamento ilegal de conteúdos “é uma mentira”, e não existe, tal como há alguns anos não era ilegal gravar música ouvida directamente da rádio. No debate, o responsável considerou que a ilegalidade deve ser atribuída ao acto de carregamento dos conteúdos para a Internet.
Considerou assim que ao darem maior foco à questão do descarregamento, os legisladores estão a ser influenciados por grupos de “lobbying” e alguns peritos do direitos autorais. E, por isso, mantêm uma legislação vaga e propensa a interpretações muito dependentes dos juízes.
Para o Partido Pirata, a questão da partilha de ficheiros e da pirataria deve ser politizada, por interferir com os direitos civis fundamentais. E porque os interessados na manutenção da actual situação de direitos autorais estão a recorrer a esse plano de luta.
O investigador do ISCTE, Miguel Caetano, considera haver uma discrepância entre a lei e o pensamento e as práticas das pessoas na partilha ou descarregamento de ficheiros. “Muitas não sabem distinguir que conteúdos estão autorizadas a descarregar”, diz. Assumem que uma vez na Internet, os conteúdos podem ser descarregados.
Patentes ou livre produção de réplicas?
Abordando os impactos da ausência de patentes, este investigador do ISCTE refutou que a produção de réplicas de produtos “extingue a inovação”. Na sua opinião, pelo contrário, impulsiona-a ao obrigar a uma diferenciação mais intensiva, na tentativa de se conseguir as preferências dos consumidores.
Nesse sentido, Nuno Cardoso deu como exemplo a evolução do Linux e Rick Falkvinge referiu o caso do sector da moda, onde não vigoram regimes de patentes. Para o político sueco, a regra não vale para todos os sectores. Mas algumas evidências mostram como nos sectores onde não existem patentes, há maiores índices de inovação.
Em sentido contrário, Luís Sousa defendeu a utilidade das patentes por assegurarem o investimento necessário para o desenvolvimento de novas gerações de produtos e tecnologias. “A inovação implica trabalho duro e investimento”, sublinhou.
Antes, Falkvinge acusou energicamente “o monopólio dos direitos de autor” de impedir aos países pobres do hemisfério sul o acesso a conhecimento de nível académico capaz de salvar vidas. Para o político, o quadro legal vigente já não se adequa à realidade.