Ex-presidente da FCCN diz que secretária de Estado da Ciência desconhece lei e CRUP e CLA são contra o fim da instituição porque viola legislação e autonomia universitária.
A integração da Fundação para a Computação Científica Nacional (FCCN) na Fundação da Ciência e Tecnologia (FCT) pode fazer aumentar o número de nomeações nos cargos directivos desta instituição, ao contrário do que disse o Ministério da Educação e Ciência (MEC) em comunicado.
O número de responsáveis no conselho directivo da FCT pode passar de três para cinco pessoas, contrariando a política anunciada pelo Governo de diminuir as nomeações. A FCT tem neste momento três responsáveis e Pedro Veiga, ex-presidente da FCCN, foi convidado para um desses cinco cargos mas recusou.
Este responsável acusa ainda a secretária de Estado da Ciência de desconhecer a legislação em vigor. Leonor Parreira não foi confrontada na Assembleia da República pela “ignorância” de que a FCCN não precisa de ser integrada no Orçamento de Estado para receber as verbas a que tem direito, quando disse querer assegurar o financiamento da instituição na audição parlamentar.
O Orçamento de Estado para 2013 diminuiu as transferências para as fundações mas exclui quatro entidades, onde se inclui a FCCN. No entanto, o Governo assume que a integração da FCCN na FCT serve “para ultrapassar um problema de financiamento” dado a Fundação não ter “existência autónoma no Orçamento do Estado”, explicou na quarta-feira a secretária de Estado da Ciência, numa audiência parlamentar requerida pelo PCP em Novembro passado. “Este mecanismo vai permitir integrar o financiamento da FCCN” no MEC, disse Leonor Parreira, citada pelo jornal Público.
“É falso”, diz Pedro Veiga. “A secretária de Estado não conhece a lei”, assegura, lembrando que o decreto-lei 5/2012 permite à FCT transferir verbas para a FCCN. Aliás, esta legislação altera outra anterior (3/2004) que já permitia essa delegação de financiamento.
Para o primeiro presidente da FCT, Luís Magalhães, também citado pelo Público, “não há nada na legislação que impeça transferências financeiras da FCT para a FCCN”, lembrando que aquela entidade já antes garantiu esse tipo de transferência de verbas.
CRUP e CLA contra
A FCCN foi fundada em 1987 pelas universidades portuguesas, pelo Laboratório Nacional de Engenharia Civil (onde está instalada) e por algumas instituições entretanto integradas na FCT.
Agora, também o Conselho de Reitores das Universidades Portuguesas (CRUP) e a Comissão Executiva do Conselho dos Laboratórios Associados (CLA) se mostraram contra a extinção da FCCN, alegando que a decisão do Governo viola a lei e a autonomia universitária.
CRUP e CLA apresentaram publicamente a “sua firme e fundamentada discordância” relativamente à intenção do Governo extinguir a FCCN. Em comunicado conjunto só agora conhecido mas datado de 4 de Janeiro – um dia após o Computerworld ter revelado que a “‘Nacionalização’ do .pt é possibilidade com integração da FCCN na FCT” -, salientam “que não foram consultados pelo Governo sobre esta matéria de fundamental interesse científico e académico, em clara violação da lei e à revelia da autonomia universitária” e esperam que o Governo “reconsidere a intenção anunciada”.
Pedro Veiga aponta igualmente que “o Governo passa por cima dos estatutos da FCCN” e “viola a legalidade” ao querer integrar a FCCN na FCT, decisão que levou à demissão do conselho executivo da instituição.
A secretária de Estado revelou ter ficado supreendida por esta demissão, dado que “ainda muito recentemente o ministro da Educação e Ciência, Nuno Crato, teve uma reunião com os altos cargos da FCCN que foi serena”.
Mas “serena” é um termo que Pedro Veiga recusa. “Fui claro a manifestar a discordância” e os directores da FCCN “podem confirmar o que digo”. Se os responsáveis governativos “não entenderam o que disse, há uma discrepância”, afirma Veiga.
Nessa reunião, a 19 de Dezembro na sede da FCCN, estiveram presentes o ministro Nuno Crato, Leonor Parreira e o seu chefe de gabinete Diogo de Faria Blanc.
Faria Blanc é apontado como um dos próximos responsáveis da FCT. Foi administrador do banco Barclays e director do BCP, está na governação do Harvard Clube de Portugal entre 2011 e 2013 (onde pontuam João Talone ou Carlos Moedas) e foi também um dos fundadores da Associação Portuguesa Contra a Leucemia, com – entre outros – Duarte Lima. A concretizar-se, a nomeação de Faria Blanc para a FCT pode envolver uma remuneração superior à que recebe enquanto chefe de gabinete de Leonor Parreira.
O conselho geral (CG) da FCCN (que agrega os responsáveis do CRUP, LNEC e FCT) reúne na manhã desta sexta-feira. Se surgir uma proposta para a nomeação de um novo conselho executivo, Pedro Veiga declarou que não aceita o cargo de que se demitiu. Embora espere a “designação de um novo conselho executivo” pelo CG, “não vou continuar”, refere, “até porque há gente mais nova e com competências que podem continuar” o trabalho na FCCN.